1. O Constitucionalismo do Futuro (ou "Constituição por Vir")
O "Constitucionalismo do Futuro", também referido como "Constitucionalismo do Por Vir", representa uma nova fase evolutiva do direito constitucional, focada no aperfeiçoamento das ideias consolidadas ao longo do tempo.
Uadi Lammêgo Bulos define esta vertente como a busca por um "ponto de equilíbrio entre as concepções hauridas do constitucionalismo moderno e os excessos do constitucionalismo contemporâneo", partindo de uma "esperança de dias melhores, numa etapa vindoura da evolução humana" (BULOS, 2014, p. 97-98).
Pedro Lenza (2020, p. 68/69) destaca que esta Constituição "por vir" deve ser fundamentada em valores essenciais para sua legitimidade e eficácia:
- Verdade: A Constituição não deve criar falsas expectativas. O poder constituinte deve ser ético, transparente e prometer apenas o que é viável cumprir. André Ramos Tavares, apoiado em Dromi, reforça esse "constitucionalismo da verdade", afirmando que a Carta deve ter exequibilidade, evitando que o excesso de protecionismo a transforme em mera carta de intenções.
- Solidariedade: Uma nova perspectiva de igualdade, baseada na solidariedade entre os povos, na dignidade da pessoa humana e na justiça social.
- Consenso: A futura Constituição deve ser resultado de um consenso democrático.
- Continuidade: Processos de reforma constitucional não devem ignorar os avanços e conquistas já consolidados.
- Participação: Exige a participação efetiva dos "corpos intermediários da sociedade", consolidando a democracia participativa.
- Integração: Prevê a criação de órgãos supranacionais para implementar uma integração espiritual, moral, ética e institucional entre os povos.
- Universalização: Refere-se à consagração dos direitos fundamentais internacionais nas futuras constituições, fazendo prevalecer a dignidade da pessoa humana universalmente e rechaçando qualquer forma de desumanização.
2. Transconstitucionalismo: O Diálogo entre Ordens Jurídicas
O transconstitucionalismo descreve o fenômeno pelo qual diversas ordens jurídicas — seja de um mesmo Estado ou de Estados diferentes — se entrelaçam para solucionar problemas constitucionais (BULOS, 2014, p. 90).
Este conceito, também chamado de constitucionalismo de níveis múltiplos ou multiplex, afasta a ideia de hierarquia entre as ordens jurídicas. Em vez disso, propõe o que Anne-Marie Slaughter define como uma "fertilização constitucional cruzada".
O transconstitucionalismo pode ser classificado de duas formas:
- Sentido Estrito: Opera entre ordens jurídicas de Estados diferentes.
- Sentido Amplo (ou Transconstitucionalismo Jurídico): Ocorre entre duas ordens jurídicas de um mesmo ordenamento, permitindo o diálogo entre entes federativos (BULOS, 2014, p. 93).
Daniel Sarmento destaca a importância desse diálogo, mesmo reconhecendo o papel central da Constituição estatal:
A Constituição estatal exerce ainda o papel fundamental nas engrenagens da sociedade contemporânea. Mas o constitucionalismo estatal não pode ser autista. Não pode se fechar às influências externas e ao diálogo com outras fontes e instâncias transnacionais. Não se trata de subserviência ou de renúncia à soberania, mas de abertura para a possibilidade de aprendizado mútuo, por meio de “fertilizações cruzadas” entre diferentes sistemas normativos. Afinal, como salientou Marcelo Neves [...], o ponto cego, o outro pode ver.
Marcelo Neves, conforme citado por Álvaro Veras, sugere que, em vez de dar privilégio absoluto a um único ordenamento para a solução de um problema, deve-se construir "pontes de transição". O objetivo é promover "conversações constitucionais" que fortaleçam os entrelaçamentos entre as diversas ordens jurídicas (estatais, internacionais, supranacionais e locais).
Não Confunda:
- Transconstitucionalismo: Reconhece problemas comuns (transconstitucionais) a diversas ordens jurídicas e propõe o diálogo entre elas.
- Constituição Transnacional: Preconiza uma única ordem constitucional supranacional que abranja múltiplos Estados.
3. Panconstitucionalismo: O Risco da Constitucionalização Excessiva
Embora o neoconstitucionalismo defenda a "constitucionalização do Direito" (a irradiação dos valores constitucionais por todo o ordenamento jurídico), o panconstitucionalismo representa a aplicação excessiva e desmedida desse fenômeno.
Segundo Daniel Sarmento e Cláudio Pereira de Souza Neto, essa constitucionalização exagerada pode gerar um viés antidemocrático. A crítica central é que, se absolutamente tudo já está decidido e definido pela Constituição, o espaço de liberdade e conformação do legislador torna-se "pequeno ou quase nulo".
Nesse cenário, os representantes eleitos do povo (o Poder Legislativo) seriam rebaixados a meros executores de medidas já impostas pelo poder constituinte, o que atenta contra o próprio regime democrático. Para que a constitucionalização ocorra de forma democrática, é imprescindível respeitar a "liberdade de conformação do legislador".
Sarmento e Souza Neto aprofundam a crítica ao viés antidemocrático do panconstitucionalismo:
“(...) não se deve supor que seja possível extrair da Constituição, pela via hermenêutica, as respostas para todos os problemas jurídicos e sociais. Quem defende que tudo ou quase tudo já está decidido pela Constituição, e que o legislador é um mero executor das medidas já impostas pelo constituinte, nega, por consequência, a autonomia política ao povo para, em cada momento da sua história, realizar as suas próprias escolhas. Se é verdade que constituições substantivas, como a brasileira, vão muito além de apenas estabelecer as “regras do jogo”, não é menos certo que um espaço mínimo para o jogo político deve ser preservado da voracidade da jurisdição constitucional. O excesso de constitucionalização do Direito — a panconstitucionalização — reveste-se, portanto, de um viés antidemocrático”
(SOUZA NETO, Cláudio Pereira de; SARMENTO, Daniel. Direito Constitucional: teoria, história e métodos de trabalho, p. 402. Belo Horizonte: Forum, 2012).
Essa crítica também se estende à "banalização constitucional", que ocorre quando temas de política ordinária são equiparados a temas tipicamente constitucionais, e ao protagonismo de juízes (agentes não eleitos) na restrição da atuação do legislador.
Como foi cobrado em prova:
O tema foi objeto de avaliação na prova de Promotor de Justiça do Paraná (2019), que considerou correta a seguinte assertiva:
"Atribui-se viés antidemocrático à panconstitucionalização – excesso de constitucionalização do Direito -, porque, se o papel do legislador se resumir ao de mero executor de medidas já impostas pelo constituinte, nega-se autonomia política ao povo para, em cada momento de sua história, realizar suas escolhas."
4. Constitucionalismo Global
O Constitucionalismo Global refere-se à tentativa de desenvolver um arcabouço normativo único que possua conteúdo materialmente constitucional, aplicável a todos os países.
Esta vertente teórica, que busca uma estrutura jurídica universal, encontra seus principais fundamentos teóricos nas obras filosóficas de Immanuel Kant e Jürgen Habermas.
5. Constitucionalismo "Whig" (ou Termidoriano)
O Constitucionalismo "Whig", também conhecido como Termidoriano, corresponde ao processo de mudança do cenário político e constitucional de forma lenta e evolutiva.
Esta abordagem se opõe a transformações revolucionárias e radicais, estando geralmente ligada a uma ideologia conservadora e reacionária.
6. Constitucionalismo Popular e a "Dificuldade Contramajoritária"
O Constitucionalismo Popular, expressão cunhada por Mark Tushnet, é uma vertente que defende a retirada do judicial review (o controle judicial de constitucionalidade). Em essência, essa teoria questiona a legitimidade de o Poder Judiciário rever os atos dos outros Poderes e, inclusive, invalidar leis.
A proposta central reivindica uma maior participação popular na determinação do significado da Constituição. A premissa é que o povo, e não os juízes, seria o intérprete mais adequado e legítimo da Carta Constitucional.
Isso gera uma tensão direta com o conceito de supremacia judicial, levantando a clássica "dificuldade contramajoritária". Este termo descreve o paradoxo de um sistema democrático onde a palavra final sobre a interpretação constitucional é dada por juízes destituídos de legitimidade democrática (pois não são eleitos).
A "dificuldade contramajoritária" aponta o judicial review como um instituto potencialmente antidemocrático, pois transfere a juízes não eleitos o poder de derrubar decisões tomadas pelos representantes do povo (o Legislativo). Essas anulações, muitas vezes, baseiam-se em interpretações pessoais sobre cláusulas constitucionais vagas, que se sujeitam a diversas leituras.
7. Constitucionalismo Transformador
O Constitucionalismo Transformador, expressão criada pelo sociólogo português Boaventura de Souza Santos, é definido como o constitucionalismo exercido pelas classes populares.
Seu objetivo central é a criação de critérios de inclusão social e a adoção de uma democracia intercultural, que engloba as dimensões representativa, participativa e comunitária.
8. Constitucionalismo Ecológico
O Constitucionalismo Ecológico consiste na constitucionalização de temas ambientais. Esse movimento pode se manifestar de diferentes formas:
- Através de fórmulas programáticas (normas que estabelecem metas e programas a serem implementados pelo Estado).
- Pelo reconhecimento do meio ambiente como um direito do homem (uma visão de constitucionalismo antropocêntrico, focado no ser humano).
- Pelo reconhecimento do meio ambiente como titular de direitos fundamentais (uma visão de constitucionalismo biocêntrico, focado na natureza em si).
9. Patriotismo Constitucional
O Patriotismo Constitucional é uma expressão originalmente criada pelo alemão Dolf Sternberger e que foi popularizada pelo filósofo Jürgen Habermas.
Este conceito define o sentimento de unidade de um povo relacionado não a uma etnia ou cultura comum, mas sim aos valores constitucionais democráticos. Trata-se do respeito nutrido pela Constituição e pelas instituições democráticas que ela estabelece.
10. Constitucionalismo Abusivo: O Uso da Constituição contra a Democracia
O "Constitucionalismo Abusivo" é um fenômeno que representa um retrocesso constitucional. Ele é caracterizado pela utilização indevida, por Estados aparentemente democráticos, de mecanismos do próprio direito constitucional para atacar e destruir as estruturas da democracia e as bases filosóficas do constitucionalismo, como o pluralismo.
O conceito foi cunhado por David E. Landau como "o uso de mecanismos de mudança constitucional para tornar um Estado significativamente menos democrático do que era antes".
Trata-se de uma deturpação da democracia sem a necessidade de golpes de Estado tradicionais. Como aponta Scheppele, são "golpes constitucionais" (constitutional coups), nos quais "não há ruptura na legalidade, em nenhum momento o governo faz algo formalmente ilegal para atingir os objetivos desejados".
Scheppele enfatiza que, através de movimentos perfeitamente legais, líderes "constitucionalmente desonestos" podem alcançar um resultado "substancialmente anticonstitucional", chegando a transformar uma democracia constitucional em uma autocracia, "parecendo honrar a Constituição o tempo todo".
Landau sugere algumas formas de limitar esse fenômeno, como:
- A doutrina da emenda constitucional inconstitucional (unconstitutional-constitutional amendment doctrine), que admite que uma emenda pode ser materialmente inconstitucional.
- Cláusulas de substituição (replacement clauses), que delimitam as hipóteses em que a Constituição poderia ser substituída.
- A atribuição de poder às Cortes Constitucionais para "validar" ou "chancelar" uma nova Constituição.
- A institucionalização de mecanismos internacionais de controle.
Posicionamento do STF:
O Supremo Tribunal Federal (STF) já abordou o tema, destacando os riscos dessa prática:
- Importância de evitar os riscos do constitucionalismo abusivo: prática que promove a interpretação ou a alteração do ordenamento jurídico, de forma a concentrar poderes no Chefe do Executivo e a desabilitar agentes que exercem controle sobre a sua atuação. Instrumento associado, na ordem internacional, ao retrocesso democrático e à violação a direitos fundamentais.
(STF, ADPF 622, Relator(a): ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em 01/03/2021, PUBLIC 21-05-2021)
Como foi cobrado em prova:
- DPE-MT (FCC, 2022): Foi cobrada a definição do constitucionalismo abusivo: “Os principais retrocessos democráticos, no mundo atual, decorrem de alterações normativas pontuais, as quais podem ser consideradas constitucionais sob o ponto de vista formal, mas que podem ser questionadas quanto à sua constitucionalidade concreta. Essa definição representa o constitucionalismo: c) abusivo”.
- MPE-SC (Instituto Consulplan, 2024): Foi considerada incorreta a assertiva que descrevia o fenômeno como o uso de mecanismos "inconstitucionais" para viabilizar "golpes de Estado". (O erro está em "inconstitucionais", pois a característica do C. Abusivo é justamente o uso de meios aparentemente legais e formais).
11. Constitucionalismo Feminista
O Constitucionalismo Feminista é uma expressão cunhada pela professora canadense Beverley Baines, que o define como "o projeto de repensar o direito constitucional de uma maneira que aborde e reflita o pensamento e a experiência feministas".
Este movimento teórico, político e social busca incluir a perspectiva de gênero no Direito Constitucional. O objetivo não é apenas revisitar tópicos clássicos sob uma nova ótica, mas "colocar novas questões, introduzir novos tópicos e assumir a responsabilidade de mudar o foco da discussão e do debate constitucional".
Uma das principais reivindicações deste movimento é a defesa de uma "constituinte feminista". Como questionam Estefânia Barboza e André Demetrio, "as Constituições e, especificamente, a brasileira (1988) foram feitas também por e para as mulheres?". A constituinte feminista busca confrontar o poder decisório e promover políticas equitativas, assegurando que a Constituição seja feita "pelas e para as mulheres", em nível de igualdade com os homens.
Um exemplo prático dessa busca foi o processo constituinte chileno. Em outubro de 2020, os chilenos aprovaram em plebiscito a elaboração de uma nova Constituição, e a Lei de Paridade de Gênero (março de 2020) determinou que a Assembleia Constituinte fosse formada com paridade entre homens e mulheres (entre 45% e 55% de seus componentes).
Posicionamento do STF:
Recentemente, o termo foi utilizado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 1008166 (Tema 548), que discutiu o dever do Estado de assegurar atendimento em creche e pré-escola a crianças de 0 a 5 anos.
A Ministra Rosa Weber (presidente) destacou a ligação do tema com o constitucionalismo feminista:
“A ministra Rosa Weber (presidente) frisou que a oferta de creche e pré-escola é imprescindível para assegurar às mães segurança no exercício do direito ao trabalho e à família, em razão da maior vulnerabilidade das trabalhadoras na relação de emprego, devido às dificuldades para a conciliação dos projetos de vida pessoal, familiar e laboral. ‘Em razão da histórica divisão assimétrica da tarefa familiar de cuidar de filhos e filhas, o tema insere-se na abordagem do chamado constitucionalismo feminista’, disse.
Rosa Weber destacou que esse direito social tem correlação com os da liberdade e da igualdade de gênero, pois proporciona à mulher a possibilidade de ingressar ou retornar ao mercado de trabalho. Para a ministra, o direito à educação básica não pode ser interpretado como discricionariedade e sim como obrigação estatal (...).”
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A tese de repercussão geral (Tema 548) fixada foi a seguinte:
1 - A educação básica em todas as suas fases, educação infantil, ensino fundamental e ensino médio, constitui direito fundamental de todas as crianças e jovens, assegurado por normas constitucionais de eficácia plena e aplicabilidade direta e imediata. 2 - A educação infantil compreende creche, de 0 a 3 anos, e a pré-escola, de 4 a 5 anos. Sua oferta pelo poder público pode ser exigida individualmente, como no caso examinado neste processo. 3 - O poder público tem o dever jurídico de dar efetividade integral às normas constitucionais sobre acesso à educação básica. (Plenário, 22.09.2022)
12. Constitucionalismo Latino-Americano (Pluralista, Andino ou Indígena)
Esta vertente, também conhecida como Constitucionalismo Pluralista ou Indígena, surge com a promulgação das Constituições do Equador (2008) e da Bolívia (2009).
Segundo Pedro Lenza (2020), este movimento sedimenta-se na ideia de "Estado plurinacional". Ele propõe uma revisão dos conceitos de legitimidade e participação popular ao reconhecer constitucionalmente o direito à diversidade cultural e à identidade, incluindo parcelas da população historicamente excluídas dos processos de decisão, como a população indígena.
Flávio Martins explica que o constitucionalismo na América do Sul buscou, ao longo de ciclos, dissociar-se do que Rachel Yrigoyen Fajardo chama de "constitucionalismo monocultural e liberal monista" — um modelo importado da Europa e imposto à realidade latino-americana sem adaptação às suas especificidades.
Estes ciclos podem ser assim divididos:
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Primeiro Ciclo: Identificado a partir da Constituição Brasileira de 1988. Ela positivou o pluralismo político, estabeleceu como objetivo o fim da discriminação (raça, sexo, cor, etc.) e manifestou a intenção de formar uma comunidade latino-americana. Contudo, apesar de abrir-se à diversidade, o Brasil manteve a visão europeia do constitucionalismo (monismo jurídico).
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Segundo Ciclo: Caracteriza-se pelo reconhecimento das tradições, costumes, autoridades e direitos dos povos originários. Flávio Martins cita como exemplos as Constituições da Colômbia (1991), México e Paraguai (1992), Peru (1993), Equador (1998) e Venezuela (1999). Há aqui o primeiro rompimento com o monismo jurídico, dando espaço ao pluralismo jurídico.
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Terceiro Ciclo: Verifica-se a construção efetiva do "Estado Plurinacional". Este ciclo vai além de apenas tutelar os povos originários, posicionando-os como integrantes do poder constituinte originário. Isso permite a introdução de valores epistemológicos próprios de suas culturas no texto constitucional (como os conceitos de "Bem Viver" e "Pachamama"). Também se destacam profundos instrumentos de controle popular do Estado, como a revogação de mandatos. Os marcos são as Constituições do Equador (2008) e da Bolívia (2009).
Atenção: Flávio Martins adverte que o Brasil ainda se encontra no primeiro ciclo constitucional. A CRFB/88 não garante a autonomia plena dos povos originários (mantendo um âmbito protetivo e mono-jurídico) e a democracia, embora classificada como semi-direta, na prática revela-se majoritariamente indireta e frágil.
Como foi cobrado em prova:
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(FCC - 2019 - DPE-SP - Defensor Público) A prova considerou correta a alternativa que definia o recente Constitucionalismo Latino-Americano como:
"c) a proposta da descolonização epistemológica e o desenvolvimento de uma epistemologia do Sul na qual os sujeitos marginalizados e subalternizados constroem uma nova percepção de si mesmos descolonizadora."
-
(DPE-PR - FUNDATEC - 2024 - Defensor Público) Nesta prova, sobre o constitucionalismo latino-americano e brasileiro, foi considerada correta a assertiva:
"B) Um traço marcante do constitucionalismo latino-americano é o da tendência do sistema presidencialista na região, com uma paradoxal relação entre a continuidade na centralidade da figura do chefe do Poder Executivo e a mudança e ampliação do rol de direitos constitucionalizados, direitos estes, contudo, que não interferem com igual peso na estruturação orgânica e desigual de poder nos desenhos constitucionais."
13. Constitucionalismo Teocrático
Também conhecido como Teocracia Constitucional, esta vertente representa um movimento político que busca conciliar os elementos do constitucionalismo moderno com a [suposta] superioridade da legislação religiosa de uma crença específica.
Conforme a lição de Flávio Martins:
“Princípios como a separação dos poderes são constitucionalmente consagrados. Não obstante, no Constitucionalismo Teocrático é comum apoiar ativamente uma religião oficial, uma única denominação. Outrossim, as leis religiosas costumam ser consagradas como a principal fonte de toda a legislação e dos métodos de interpretação judicial. E não é só isso: além de prever uma religião oficial única, nas teocracias constitucionais, nenhuma lei pode ser promulgada se for contrária aos preceitos religiosos. Para operacionalizar a análise da validade, autoridades e organismos religiosos cooperam com tribunais civis por meio de suas decisões que, embora simbólicas, têm um peso notável, desempenhando papel significativo na vida pública”.
Citando Ran Hirschl, Flávio Martins aponta as seguintes características principais do Constitucionalismo Teocrático:
- A adesão a alguns ou todos os elementos centrais do constitucionalismo moderno (como a distinção formal entre autoridade política e religiosa e a existência de revisão judicial).
- A presença de uma única religião ou denominação religiosa, formalmente aprovada como "a religião do Estado”.
- A consagração constitucional da religião, seus textos e diretrizes como a fonte fundamental de legislação e interpretação judicial.
- Um nexo entre organismos religiosos e tribunais civis, onde os primeiros, embora com peso simbólico, têm status oficial e operam em conjunto com a jurisdição civil.
Matéria: Direito Constitucional | Assunto: Constitucionalismo | Banca: CEBRASPE | Ano: 2017 | Órgão: DPE-AL | Cargo: Defensor Público Substituto
Acerca do movimento da constitucionalização do direito, julgue os itens a seguir.
I. Uma das consequências da constitucionalização do direito é a chamada eficácia horizontal dos direitos fundamentais.
II. No contexto do Estado constitucional, são legítimos a atuação discricionária do juiz e o controle judicial dos critérios de oportunidade e conveniência do gestor público.
III. O aumento da importância das Constituições democráticas, com a irradiação de suas normas para todo o ordenamento jurídico, ampliou a liberdade de conformação do legislador.
IV. A constitucionalização do direito engloba a constitucionalização-inclusão e a constitucionalização-releitura.
Estão certos apenas os itens
GUIA DE ESTUDOS
1. O que define o "Constitucionalismo do Futuro" e qual o seu objetivo principal segundo Uadi Lammêgo Bulos?
O "Constitucionalismo do Futuro" representa uma fase evolutiva do direito constitucional focada no aperfeiçoamento de ideias já consolidadas. Segundo Uadi Lammêgo Bulos, seu objetivo é buscar um "ponto de equilíbrio entre as concepções hauridas do constitucionalismo moderno e os excessos do constitucionalismo contemporâneo", partindo de uma esperança de evolução humana.
2. Explique o conceito de Transconstitucionalismo e diferencie suas classificações em sentido estrito e amplo.
O Transconstitucionalismo descreve o entrelaçamento de diversas ordens jurídicas para solucionar problemas constitucionais, propondo um diálogo sem hierarquia. Em sentido estrito, opera entre ordens jurídicas de Estados diferentes, enquanto em sentido amplo, ocorre entre duas ordens jurídicas de um mesmo ordenamento, como entre entes federativos.
3. Qual é a principal crítica ao Panconstitucionalismo e por que ele é associado a um "viés antidemocrático"?
A principal crítica ao Panconstitucionalismo é que a aplicação excessiva da constitucionalização do Direito reduz o espaço de liberdade do legislador. Isso gera um viés antidemocrático porque, se tudo já está definido pela Constituição, os representantes eleitos tornam-se meros executores de medidas impostas pelo poder constituinte, negando a autonomia política do povo para fazer suas próprias escolhas.
4. O que é a "dificuldade contramajoritária" e como ela se relaciona com o Constitucionalismo Popular?
A "dificuldade contramajoritária" é o paradoxo de um sistema democrático onde juízes não eleitos (sem legitimidade democrática) dão a palavra final na interpretação constitucional, podendo invalidar leis criadas por representantes do povo. Ela se relaciona diretamente com o Constitucionalismo Popular, que questiona essa supremacia judicial e defende que o próprio povo deveria ser o intérprete legítimo da Constituição.
5. Descreva o fenômeno do Constitucionalismo Abusivo e como ele se diferencia de um golpe de Estado tradicional.
O Constitucionalismo Abusivo é o uso de mecanismos do próprio direito constitucional para atacar e destruir as estruturas da democracia. Ele se diferencia de um golpe tradicional porque não há uma ruptura formal da legalidade; líderes utilizam meios aparentemente legais para alcançar um resultado substancialmente anticonstitucional.
6. Quais são as duas principais visões do Constitucionalismo Ecológico em relação ao meio ambiente?
O Constitucionalismo Ecológico pode se manifestar pelo reconhecimento do meio ambiente como um direito do homem (visão antropocêntrica) ou pelo reconhecimento do meio ambiente como titular de direitos fundamentais em si mesmo (visão biocêntrica).
7. Defina o Patriotismo Constitucional e explique qual é a base do sentimento de unidade proposto por essa vertente.
O Patriotismo Constitucional, popularizado por Jürgen Habermas, define o sentimento de unidade de um povo com base nos valores constitucionais democráticos. A base dessa união não é uma etnia ou cultura comum, mas o respeito nutrido pela Constituição e pelas instituições que ela estabelece.
8. Qual é o objetivo central do Constitucionalismo Feminista e como o processo constituinte chileno exemplificou essa busca?
O objetivo central do Constitucionalismo Feminista é repensar o direito constitucional para incluir a perspectiva de gênero, abordando o pensamento e a experiência feministas. O processo constituinte chileno foi um exemplo prático ao determinar por lei a paridade de gênero na composição da Assembleia Constituinte, com representação entre 45% e 55% para homens e mulheres.
9. Quais são os marcos constitucionais que iniciaram o Constitucionalismo Latino-Americano e qual a sua ideia central?
O Constitucionalismo Latino-Americano surge com a promulgação das Constituições do Equador (2008) e da Bolívia (2009). Sua ideia central é a construção de um "Estado plurinacional", que reconhece constitucionalmente o direito à diversidade cultural e inclui parcelas da população historicamente excluídas, como os povos indígenas.
10. Cite três características principais do Constitucionalismo Teocrático, conforme a lição de Flávio Martins.
Três características do Constitucionalismo Teocrático são: a presença de uma religião oficial única aprovada como "a religião do Estado"; a consagração constitucional dos textos religiosos como fonte fundamental da legislação; e um nexo entre organismos religiosos e tribunais civis, onde os primeiros influenciam a vida pública.
DISCURSIVAS PARA PRÁTICA
- Discorra sobre a tensão entre o Panconstitucionalismo e a democracia. De que maneira a "liberdade de conformação do legislador" atua como um pilar para a legitimidade democrática, segundo o texto?
- Compare o Constitucionalismo "Whig" (Termidoriano) com o Constitucionalismo Transformador. Analise como suas abordagens opostas (evolutiva e conservadora vs. popular e inclusiva) refletem diferentes visões sobre o papel da Constituição na sociedade.
- Explique como o conceito de Transconstitucionalismo, com sua proposta de "fertilização constitucional cruzada", desafia noções tradicionais de soberania estatal. De que forma essa abordagem difere do Constitucionalismo Global?
- Analise o Constitucionalismo Abusivo, detalhando como líderes podem utilizar mecanismos "constitucionalmente desonestos", mas formalmente legais, para minar a democracia. Discuta as soluções propostas por David E. Landau para limitar esse fenômeno.
- O Constitucionalismo Latino-Americano é descrito como uma resposta ao "constitucionalismo monocultural". Explique os três ciclos de evolução dessa vertente na América do Sul e posicione o Brasil nesse contexto, conforme a análise de Flávio Martins.