1. Classificação das Lacunas
| Tipo de Lacuna | Descrição |
|---|---|
| Lacuna Normativa | Ausência total de norma para o caso concreto. |
| Lacuna Ontológica | Existe norma para o caso, mas ela não possui eficácia social. |
| Lacuna Axiológica | Existe norma para o caso, mas ela é considerada injusta ou inadequada. |
| Lacuna de Conflito ou Antinomia | Conflito entre duas normas aplicáveis ao mesmo caso, gerando dúvida sobre qual aplicar. |
É obrigatória a observância da ordem do Art. 4º da LINDB?
Art. 4. Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito.
| Visão CLÁSSICA | Sim, a ordem prevista no art. 4° da LINDB é de observância obrigatória (Silvio Rodrigues, Clóvis Beviláqua, Washington de Barros Monteiro, Maria Helena Diniz). |
| Visão MODERNA | Segundo Tartuce (2020, p.41), “até pode-se afirmar que essa continua sendo a regra (observância obrigatória da ordem), mas nem sempre o respeito a essa ordem deverá ocorrer, diante da força normativa e coercitiva dos princípios, notadamente daqueles de índole constitucional”. Autores contemporâneos que defendem essa visão: Gustavo Tepedino, Zeno Veloso, Daniel Sarmento. Fundamentos legais: 1) Art. 5, §1, CF que trata da aplicabilidade ilimitada das normas de direitos fundamentais; 2) Art. 8, CPC, que prevê o princípio da dignidade da pessoa humana como ponto de partida para as decisões judiciais. |
2. Analogia
É a aplicação de uma norma próxima ou de um conjunto de normas próximas, não havendo uma norma prevista para um determinado caso concreto.
2.1. Classificação da Analogia
| Tipo de Analogia | Definição |
|---|---|
| Analogia Legal ou Legis | Aplicação de somente uma norma próxima, como ocorre nos exemplos citados. |
| Analogia Jurídica ou Iuris | Aplicação de um conjunto de normas próximas, extraindo elementos que possibilitem a analogia. |
2.2.🚫Não Confunda!
| Conceito | Característica Principal |
|---|---|
| Analogia | Rompe com os limites do que está previsto na norma, havendo integração da norma jurídica. |
| Interpretação Extensiva | Apenas amplia-se o seu sentido, havendo subsunção. |
Observação: As normas de exceção ou normas excepcionais não admitem analogia ou interpretação extensiva.
3. Costumes ou Consuetudo
Segundo Tartuce (2020, p. 46), SÃO “práticas e usos reiterados com conteúdo lícito e relevância jurídica”.
Requisitos para aplicação (Limongi França):
- continuidade;
- uniformidade;
- diuturnidade;
- moralidade;
- obrigatoriedade.
| Tipo de Costume | Definição |
|---|---|
| Costume Secundum Legem Segundo a Lei |
Incidem quando há referência expressa aos costumes no texto legal. Na aplicação dos costumes secundum legem, não há integração, mas subsunção, eis que a própria norma jurídica é que é aplicada. |
| Costume Praeter Legem Na Falta da Lei |
Aplicados quando a lei for omissa, sendo denominado costume integrativo, eis que ocorre a utilização propriamente dita dessa ferramenta de correção do sistema. Nesse caso, há integração. Ex. Cheque pós-datado (Súmula 370, STJ). |
| Costume Contra Legem Contra a Lei |
Incidem quando a aplicação dos costumes contraria o que dispõe a lei. Não há que se falar em integração. |
4. Costume Judiciário ou Jurisprudencial
Segundo Tartuce (2020, p. 47), a jurisprudência consolidada pode constituir elemento integrador do costume, a exemplo dos entendimentos sumulados.
Caracteriza dano moral a apresentação antecipada de cheque pré-datado. (Julgado em 16/02/2009, DJe 25/02/2009).
5. Princípios Gerais do Direito
Para Nelson Nery Jr “são regras de conduta que norteiam o juiz na interpretação da norma, do ato ou negócio jurídico. Os princípios gerais de direito não se encontram positivados no sistema normativo. São regras estáticas que carecem de concreção”.
| Princípios Fundamentais do CC | Conceito |
|---|---|
| Eticidade | Valorização da ética e da boa-fé, principalmente daquela que existe no plano da conduta de lealdade das partes (boa-fé objetiva). FUNÇÕES DA BOA-FÉ OBJETIVA: - INTERPRETATIVA: tem função de interpretação dos negócios jurídicos em geral (art. 113 do CC). - CONTROLE: serve ainda como controle das condutas humanas, eis que a sua violação pode gerar o abuso de direito, nova modalidade de ilícito (art. 187). - INTEGRATIVA: tem a função de integrar todas as fases pelas quais passa o contrato (art. 422 do CC). |
| Socialidade | Impõe prevalência dos valores coletivos sobre os individuais, respeitando os direitos fundamentais da pessoa humana. Ex: princípio da função social do contrato, da propriedade. |
| Operabilidade | Impõe soluções viáveis, operáveis e sem grandes dificuldades na aplicação do direito. A regra tem que ser aplicada de modo simples. Exemplo: princípio da concretude pelo qual deve-se pensar em solucionar o caso concreto de maneira mais efetiva. |
6. Equidade
A equidade pode ser entendida como a aplicação da justiça de acordo com as particularidades de cada caso, considerando as circunstâncias únicas e as necessidades específicas das partes envolvidas.
| Classificação | Conceito |
|---|---|
| Legal | É a equidade prevista em lei. Ou seja, a lei determina quando e como a equidade deve ser aplicada. |
| Judicial | É a equidade aplicada pelo juiz, quando a lei o autoriza a decidir por equidade em um caso específico. Art. 140, Parágrafo único, CPC/15. |
Julgar por Equidade: “significaria desconsiderar as regras e normas jurídicas, decidindo-se com outras regras. A título de exemplo, o julgador decide com base em máximas econômicas, como a teoria dos jogos”;
Julgar com Equidade: “tem o sentido de decidir-se de acordo com a justiça do caso concreto.”
7. ANTINOMIA
Trata-se da coexistência de duas normas que, embora válidas e emitidas por autoridades competentes, apresentam disposições conflitantes entre si.
Esse impasse gera incerteza sobre qual regra deve ser aplicada a um caso concreto, criando o que se convencionou chamar de "lacunas de colisão".
- Antinomia Aparente: Refere-se à situação de conflito que pode ser resolvida pela aplicação dos chamados metacritérios (como o hierárquico, o da especialidade ou o cronológico). Embora exista um conflito inicial, o próprio sistema fornece as ferramentas para superá-lo.
- Antinomia Real: Ocorre quando o conflito normativo não pode ser resolvido mesmo com a aplicação dos metacritérios. Nesses casos, as regras de solução de conflitos são insuficientes, exigindo uma abordagem diferente para restabelecer a harmonia do sistema.
7.1. Metacritérios Clássicos
Para solucionar a maioria dos conflitos normativos (as antinomias aparentes), o ordenamento jurídico se vale de metacritérios, que são regras sobre a aplicação de outras regras. Segundo a clássica definição de Norberto Bobbio, existem três critérios principais:
- Critério Cronológico: Baseia-se no tempo de vigência da norma. Sob este critério, a norma posterior prevalece sobre a norma anterior (lex posterior derogat legi priori).
- Critério da Especialidade: Leva em conta o âmbito de aplicação da norma. A norma especial, que regula uma matéria específica, prevalece sobre a norma geral (lex specialis derogat legi generali).
- Critério Hierárquico: Fundamenta-se na posição da norma dentro da estrutura escalonada do sistema jurídico (como a pirâmide de Kelsen). A norma superior prevalece sobre a norma inferior (lex superior derogat legi inferiori).
7.2. Antinomias de 1º Grau: Conflitos Simples
As antinomias de 1º grau representam a forma mais simples de conflito normativo, caracterizando-se por envolverem apenas um dos metacritérios clássicos de solução (cronológico, especialidade ou hierárquico).
7.3. Antinomias de 2º Grau: O Choque de Critérios
As antinomias de 2º grau surgem em cenários mais complexos, onde o conflito entre normas válidas envolve o choque entre dois dos metacritérios analisados (cronológico, especialidade e hierárquico).
Nessas situações, é preciso avaliar qual critério prevalecerá sobre o outro:
- Norma especial anterior vs. Norma geral posterior: Neste caso, há um conflito entre o critério da especialidade (que favorece a primeira norma) e o cronológico (que favorece a segunda). A solução consolidada é que prevalece o critério da especialidade, mantendo-se a aplicação da norma específica, mesmo que mais antiga.
- Norma superior anterior vs. Norma inferior posterior: Aqui, o conflito se dá entre o critério hierárquico (da norma superior) e o cronológico (da norma posterior). O sistema prioriza a estrutura escalonada do Direito, e prevalece o critério hierárquico.
- Norma geral superior vs. Norma especial e inferior: Este é o cenário mais complexo, pois coloca o critério hierárquico (da norma geral) em colisão com o da especialidade (da norma inferior). Neste caso, configura-se uma antinomia real, pois não há um metacritério pré-definido que estabeleça a prevalência.
7.3.1. Soluções para Antinomias ReaisPublicidade
Quando os metacritérios clássicos se mostram insuficientes para resolver um conflito normativo—configurando uma antinomia real, como no choque entre uma norma geral superior e uma norma especial inferior—o sistema jurídico precisa recorrer a outras instâncias para solucionar o impasse.
Segundo Maria Helena Diniz, não é possível estabelecer uma metarregra geral para esses casos, não havendo prevalência automática entre os critérios conflitantes. Surgem, então, duas soluções possíveis:
- Solução do Poder Legislativo: O próprio Legislativo pode intervir editando uma terceira norma. O objetivo dessa nova lei seria esclarecer a situação, prevendo expressamente qual das normas em conflito deverá ser aplicada, desfazendo assim a antinomia.
- Solução do Poder Judiciário: Na ausência de uma solução legislativa, cabe ao Poder Judiciário resolver o caso concreto. O magistrado deverá adotar o princípio máximo de justiça, utilizando-se das ferramentas de integração normativa. Com amparo nos artigos 4º e 5º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB) e no artigo 8º do Código de Processo Civil de 2015 (CPC/15), o juiz adotará uma das normas conflitantes para solucionar o problema em questão, decidindo da forma que melhor atender aos fins sociais e às exigências do bem comum.
Matéria: Direito Civil | Assunto: LINDB | Subassunto: Fontes | Banca: MPE-GO | Ano: 2019 | Órgão: MPE-GO | Cargo: Promotor de Justiça Substituto
Sobre a vigência das normas no Direito Brasileiro, disciplinada pelo Decreto-Lei n. 4.657/42 (Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro), é incorreto afirmar:
GUIA DE ESTUDOS
1. Diferencie lacuna normativa de lacuna axiológica.
A lacuna normativa ocorre quando há uma ausência total de norma para regular um caso concreto. Já na lacuna axiológica, a norma existe, mas é considerada injusta ou inadequada para a solução do caso.
2. Qual é a visão moderna sobre a obrigatoriedade da ordem de aplicação dos métodos de integração previstos no Art. 4º da LINDB?
A visão moderna sustenta que a ordem do Art. 4º da LINDB (analogia, costumes, princípios) nem sempre precisa ser seguida. Essa flexibilidade se deve à força normativa dos princípios, especialmente os de índole constitucional, como a dignidade da pessoa humana.
3. Qual é a principal diferença entre analogia e interpretação extensiva?
A principal diferença é que a analogia rompe com os limites do que está previsto na norma, aplicando uma norma próxima para integrar o ordenamento. A interpretação extensiva, por outro lado, não cria uma nova regra, apenas amplia o sentido de uma norma já existente, havendo subsunção.
4. Descreva o que é o costume praeter legem e em que situação ele gera a integração da norma.
O costume praeter legem (na falta da lei) é aplicado quando a lei é omissa, servindo como uma ferramenta de correção do sistema. Ele gera a integração da norma justamente por preencher uma lacuna normativa com base em práticas e usos reiterados.
5. De acordo com o princípio da Eticidade, quais são as três funções da boa-fé objetiva?
As três funções da boa-fé objetiva são: a função interpretativa (para a interpretação de negócios jurídicos); a função de controle (para coibir o abuso de direito); e a função integrativa (que se aplica a todas as fases do contrato).
6. Explique a diferença conceitual entre "julgar por equidade" e "julgar com equidade".
"Julgar por equidade" significa desconsiderar as normas jurídicas existentes e decidir com base em outras regras. "Julgar com equidade" significa decidir de acordo com a justiça do caso concreto, considerando suas particularidades, mas dentro dos limites autorizados pela lei.
7. O que é uma antinomia e por que ela é considerada uma "lacuna de colisão"?
Antinomia é a coexistência de duas normas válidas, mas com disposições conflitantes, gerando incerteza sobre qual aplicar. Ela é chamada de "lacuna de colisão" porque o conflito entre as normas cria um vácuo ou impasse na aplicação da lei que precisa ser solucionado.
8. Liste e descreva brevemente os três metacritérios clássicos para a solução de antinomias aparentes.
Os três metacritérios são: Cronológico (lex posterior derogat legi priori), onde a norma posterior prevalece sobre a anterior; da Especialidade (lex specialis derogat legi generali), onde a norma especial prevalece sobre a geral; e Hierárquico (lex superior derogat legi inferiori), onde a norma superior prevalece sobre a inferior.
9. Como se resolve o conflito entre uma norma especial anterior e uma norma geral posterior? Qual critério prevalece?
Nesse conflito entre o critério da especialidade e o cronológico, a solução consolidada é que prevalece o critério da especialidade. Assim, a norma especial anterior continua a ser aplicada em detrimento da norma geral posterior.
10. Quais são as duas soluções possíveis para uma antinomia real, quando os metacritérios clássicos são insuficientes?
A primeira solução é a do Poder Legislativo, que pode editar uma terceira norma para esclarecer qual das regras conflitantes deve ser aplicada. A segunda é a do Poder Judiciário, que, na ausência de solução legislativa, deve resolver o caso concreto utilizando as ferramentas de integração normativa para atender aos fins sociais e ao bem comum.
DISCURSIVAS PARA PRÁTICA
- Discuta a evolução da interpretação do Art. 4º da LINDB, contrapondo a visão clássica e a visão moderna sobre a ordem hierárquica dos métodos de integração. Analise os fundamentos legais e doutrinários que sustentam a perspectiva moderna.
- Explique o conceito de antinomia no ordenamento jurídico. Diferencie as antinomias aparentes das reais, detalhando como os metacritérios clássicos funcionam para solucionar as de 1º grau e quais são os desafios apresentados pelas antinomias de 2º grau.
- Desenvolva o papel dos Princípios Gerais do Direito como método de integração normativa. Apresente os três princípios fundamentais do Código Civil (Eticidade, Socialidade e Operabilidade) e exemplifique como cada um deles orienta a aplicação do direito em casos concretos.
- Compare os conceitos de analogia e interpretação extensiva, destacando suas finalidades, limites e a principal distinção entre eles no processo de aplicação da lei. Explique por que normas de exceção não admitem a aplicação de nenhum desses institutos.
- Elabore sobre os diferentes tipos de costumes e seu papel no direito. Diferencie os costumes secundum legem, praeter legem e contra legem, explicando em quais situações o costume atua como método de integração e em quais ele funciona como simples subsunção ou é rechaçado pelo ordenamento.