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1. EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO PROCESSO CIVIL

Inicialmente, é oportuno mencionar que a doutrina aponta que a ciência do processo desenvolveu-se em meados do século XIX e que até o surgimento dessa ciência existiu uma fase que pode ser chamada de praxismo.

O praxismo é uma fase em que a preocupação dos estudiosos ou operadores do Direito se dava apenas em relação às práticas forenses. Nesta época, o processo não era visto distintamente do direito material.

Posteriormente, temos a etapa do processualismo, onde o processo passa a ser encarado de forma autônoma em relação ao direito material, surgindo, com isso, uma ciência do processo. Trata-se de uma fase em que os conceitos fundamentais da ciência processual começam a ser firmados, a qual dura até meados do século XX.

Já na segunda metade do século XX, no período pós-segunda guerra, tem-se início ao instrumentalismo, momento em que a ciência do processo começa a apresentar outras preocupações, a saber:

  • Reaproximação entre o processo e o direito material, sem os confundir;
  • Preocupação com a EFETIVIDADE do processo, ou seja, se ele está funcional;
  • Estudo do processo a partir de outra metodologia, ou a metodologia de outras ciências (como o exemplo da sociologia – temos aqui o estudo do acesso à justiça e suas ondas);
  • Não se preocupa com a reformulação dos conceitos construídos anteriormente.

Diante disso, resta a discussão sobre em qual fase o direito processual hodierno se encontra. Segundo o professor Didier, a ciência processual atual encontra-se em outra fase, em razão de ter passado por profundas transformações. Como exemplos de mudanças, o professor enumera:

  • Princípios como espécie normativa;
  • Jurisprudência como fonte de norma;
  • Ideia de que a interpretação é uma atividade criativa (o intérprete dá sentido à norma);
  • Diferença entre texto e norma;
  • Direitos fundamentais com força normativa;
  • Proporcionalidade e Razoabilidade.

Assim, temos vivido uma fase de reconstrução dos conceitos de processo desenvolvidos durante a fase do instrumentalismo, mas sem negar premissas deste. Esta nova fase, conforme o professor Didier, pode ser chamada de neoprocessualismo. Entretanto, insta salientar que o tema ainda é controverso.

🚩 NÃO CONFUNDA: Princípios fundamentais ou princípios informativos (formativos): Os princípios fundamentais do processo são as diretrizes gerais, não se confundindo com os princípios informativos :

  • Lógico: a sequência de atos no processo deve obedecer a um regramento lógico, de forma que os supervenientes derivem dos precedentes, em uma ordenação que faça sentido. Não seria lógico, por exemplo, que se fizesse correr um prazo recursal antes que a decisão fosse proferida.
  • Econômico: o processo deve buscar obter o melhor resultado possível com o menor dispêndio de recurso e de esforços.
  • Jurídico: o processo deve respeitar as regras previamente estabelecidas no ordenamento jurídico.
  • Político: o processo deve buscar o seu fim último, que é a pacificação social, com o menor sacrifício social possível.

2. FASES METODOLÓGICAS DO DIREITO PROCESSUAL

Segundo Haroldo Lourenço , o Direito Processual Civil sucessivamente foi passando por algumas fases metodológicas, o que se mostra relevante para se compreender o estágio atual, denominado de neoprocessualismo ou formalismo valorativo, no qual o processo civil sofreu uma leitura constitucional, criando-se um “modelo constitucional de processo”. Como se pode observar do art. 1 do CPC/2015 deve ser “ordenado, disciplinado e interpretado conforme os valores e normas fundamentais estabelecidos na Constituição”. Vejamos uma síntese dessas fases, conforme ensina o autor:

2.1. PRAXISMO OU FASE SINCRETISTA

Ocorria uma confusão entre o direito material e o processual – o processo era estudado apenas em seus aspectos práticos, sem preocupações científicas. A ação era o direito material em movimento, ou seja, uma vez lesado, esse direito adquiria forças para obter em juízo a reparação da lesão sofrida. Nessa fase, ainda não se visualizava a autonomia da relação jurídica processual em confronto com a relação jurídica material. O direito processual não era um ramo autônomo do direito e, tampouco, havia estudos para uma pretensa autonomia científica. O que havia era um conjunto de formas para o exercício do direito, sob uma condução pouco participativa do juiz.

No século XIX, com o estudo pelos alemães da natureza jurídica da ação, bem como da natureza jurídica do processo, tal fase começou a ruir, pois os conhecimentos eram empíricos, sem nenhuma consciência de princípios ou embasamento científico.

2.2. PROCESSUALISMO OU FASE DO AUTONOMISMO

O processo passou a ser estudado autonomamente, ganhando relevo a afirmação científica do processo. Durante praticamente um século, tiveram lugar as grandes teorias processuais, especialmente sobre a natureza jurídica da ação e do processo, as condições da ação e os pressupostos processuais.

A afirmação da autonomia científica do direito processual foi uma grande preocupação desse período, em que as grandes estruturas do sistema foram traçadas e os conceitos largamente discutidos e amadurecidos.

Caracterizou-se por ser uma fase muito introspectiva, tomando-se o processo, pelo processo apenas. Essa fase, a rigor, tornou-se autofágica, distanciada da realidade, gerando um culto exagerado às formas processuais, no afã de enfatizar a autonomia científica.

2.3. INSTRUMENTALISMO

O processo, embora autônomo, passa a ser encarado como instrumento de realização do direito material, a serviço da paz social. Como a primeira fase metodológica não visualizava o processo como instituição autônoma, a segunda acabou enfatizando, demasiadamente, a técnica, o formalismo.

Nesse sentido, surgiu a instrumentalidade, negando o caráter puramente técnico do processo, demonstrando que o processo não é um fim em si mesmo, mas um meio para se atingir um fim, dentro de uma ideologia de acesso à justiça. Essa fase é, eminentemente, crítica, pois o processualista moderno sabe que a sua ciência atingiu níveis expressivos de desenvolvimento, porém o sistema ainda é falho na sua missão de produzir justiça. O processo passou a ser analisado a partir de resultados práticos, levando em conta o consumidor do serviço judiciário. Não obstante se reconheçam as diferenças funcionais entre o direito processual e o direito material, estabelece-se entre eles uma relação circular de interdependência: o direito processual concretiza e efetiva o direito material, que confere ao primeiro o seu sentido. É a chamada teoria circular dos planos processual e material.

2.4. NEOPROCESSUALISMO

Formalismo valorativo, formalismo ético ou modelo constitucional de processo: A partir da evolução dessas fases metodológicas, sob a influência do neoconstitucionalismo, começou-se a se cogitar do neoprocessualismo, que interage com o instrumentalismo. Fato é que o direito processual civil está vivendo uma nova fase, uma quarta (DIDIER JR., 2015. p. 42-46), não importando a denominação que se utilize. Tal fase se mostra bem marcante com o CPC/2015, o qual consagra dos arts. 1 a 12 as denominadas “normas fundamentais do processo civil”, que introduzem a parte geral do CPC e consagram direitos fundamentais processuais, ou seja, as normas infraconstitucionais buscam concretizar as disposições constitucionais. Cabe ressaltar que o rol de normas fundamentais previsto no CPC/2015 não é exaustivo (Enunciado 369 FPPC), eis que, por exemplo, não há previsão do princípio do juiz natural, bem como pode ser regra ou princípio (Enunciado 370 FPPC).


3. TEORIA DAS NORMAS FUNDAMENTAIS

Conforme Fredie Didier, o atual Código de Processo Civil estabeleceu uma parte geral (a qual não existia no código anterior), cujo primeiro capítulo é destinado às normas fundamentais do processo civil, um conceito de direito positivo que não existia anteriormente. Agora, o legislador usa essa terminologia para designar uma parte do Código que vai do Art. 1 ao 12 do CPC.

Aqui surge um problema: é preciso entender qual o papel dessas normas fundamentais no sistema. Assim, conforme o professor Didier, é preciso desenvolver uma Teoria das Normas Fundamentais do Processo Civil.

Para tanto, é necessário desenvolver por um conceito essencial que é o de norma fundamental, o qual, no processo civil brasileiro, assume 2 características ou funções:

  • DEFINE O MODELO DE PROCESSO CIVIL, isto é, consiste em norma definidora do modelo de processo adotado no Brasil.
  • TEM UM PAPEL HERMENÊUTICO, ou seja, orienta a interpretação das demais normas do processo civil.

Assim, toda norma processual civil que cumpra essas duas funções é uma norma fundamental.

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3.1. CONSTITUCIONALIZAÇÃO DO PROCESSO CIVIL (Art. 1 CPC c/c Arts 8 CPC e 5, LINDB)

Um fenômeno observado na teoria das normas fundamentais do processo civil é a previsão expressa da constitucionalização deste ramo processual, a qual está prevista no art. 1 do CPC. Por oportuno, confira-se a sua redação:

Art. 1. O processo civil será ordenado, disciplinado e interpretado conforme os valores e as normas fundamentais estabelecidos na Constituição da República Federativa do Brasil, observando-se as disposições deste Código.

Como visto, o processo civil será ordenado, disciplinado e interpretado conforme a CF/88; verifica-se, assim, uma relação de subordinação entre o Código de Processo Civil e Constituição Federal, a qual implica na obrigatória observação dos princípios fundamentais, valores e normas previsto na Carta Magna.

Ademais, percebe-se que o legislador optou pela positivação de inúmeros princípios no CPC que antes só constavam da Constituição. Essa ideia, que nos remete ao movimento de “constitucionalização do Direito” (Hermes Zanetti), vem positivada na legislação processual civil no texto dos Arts. 1 e 8 do CPC/2015, que repetem alguns aspectos contidos nos artigos 1, 3 e 37, caput da Constituição Federal.

3.2. NATUREZA DAS NORMAS FUNDAMENTAIS

Neste ponto, destaca-se que as normas fundamentais podem se tratar de princípios ou de regras. Além disso, poderão ser extraídas da Constituição Federal (a exemplo da proibição da prova ilícita) ou do próprio CPC, seja no rol previsto pelos arts. 1 a 12, seja em outros artigos do Código (p. ex.: art. 190, que estabelece uma autorização genérica para celebrar negócios processuais; art. 927, que estabelece o dever de observar precedentes obrigatórios; art. 489, §1o e §2, o qual estabelece o dever de motivação, dentre outros).

Importa dizer, ainda, que determinadas normas previstas pelo CPC consistem em cópias exatas da Constituição. Tratam-se das “normas-clones” (que clonam a constituição) e um ponto de extrema relevância é perceber que, se a norma foi copiada da Constituição para a Lei, uma vez não observada essa norma, a violação a estes dispositivos se dá em prejuízo da Constituição (e não do CPC), ensejando a interposição de Recurso Extraordinário (e não de Recurso Especial). Examinados o conceito e a natureza das normas fundamentais do processo civil, passa-se, agora, à análise dessas normas em espécie.

Matéria: Direito Processual Civil | Assunto: Noções Introdutórias e Princípios | Banca: CEBRASPE | Ano: 2023 | Órgão: PGE-PA | Cargo: Procurador do Estado Substituto


Acerca da teoria geral do processo, julgue os itens a seguir.

I A primeira fase metodológica do processo civil é conhecida também como praxismo e corresponde à época em que o processo era visto como mero procedimento, simples sucessão de atos e formas, não havendo distinção entre direito material e direito processual, pois o procedimento era visto como apêndice do direito material.

II O instrumentalismo é a fase que visa estabelecer o elo entre o direito processual e o direito material, entendendo-se que há uma sobreposição do processo sobre o direito material.

III Para a doutrina do neoprocessualismo, a técnica legislativa das cláusulas gerais deve ser evitada, para ser garantida maior segurança jurídica das relações e evitado o ativismo judicial.

IV No formalismo-valorativo, destaca-se a importância que se deve dar aos valores constitucionalmente protegidos na pauta de direitos fundamentais e no reforço dos aspectos éticos do processo, com especial destaque para a afirmação do princípio da cooperação.

Assinale a opção correta.

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em 28/10/2025
Matéria: Direito Processual Civil
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